OBJETIVOS DO BLOGUE

Olá, bem-vindo ao blog "Chaves para a Sabedoria". A página objetiva compartilhar mensagens que venham a auxiliar o ser humano na sua caminhada espiritual. Os escritos contém informações que visam fornecer elementos para expandir o conhecimento individual, mostrando a visão de mestres e sábios, cada um com a sua verdade e experiência. Salientando que a busca pela verdade é feita mediante experiências próprias, servindo as publicações para reflexões e como norte e inspiração na busca da Bem-aventurança. O blog será atualizado com postagens de textos extraídos de obras sobre o tema proposto. Não defendemos nenhuma religião em especial, mas, sim, a religiosidade e a evolução do homem pela espiritualidade. A página é de todos, naveguem a vontade. Paz, luz, amor e sabedoria.

Osmar Lima de Amorim


terça-feira, 17 de outubro de 2017

O PENSADOR PRECISA ENTENDER A SI MESMO (2ª PARTE)

"(...) Os pensamentos são o próprio pensador; eles não estão separados. O pensador se separou dos pensamentos para se proteger; assim, pode modificar os pensamentos de acordo com as circunstâncias, mantendo-se afastado. Esse é um dos truques da mente: separar o pensador dos pensamentos para se dedicar a transformá-los.

Tudo isso é um engano, uma ilusão, um jeito esperto do pensador se proteger, como que para assegurar sua própria permanência, enquanto os pensamentos são impermanentes. Assim, o ego se perpetua. Mas o 'eu' não é permanente, seja o eu inferior ou o eu superior. Ambos ainda estão dentro do campo da memória e do tempo.

A razão para dar tanta importância à psicologia é o fato da mente ser a causa de todas as ações. Sem compreender isso, não há sentido em fazer reformas, desperdiçar o tempo, pôr ordem em ações superficiais. Temos agido assim por muitas gerações, mas só produzimos confusão, loucura e miséria no mundo. 

Por isso, temos que ir até a raiz de todos os problemas da existência e da consciência: o eu, o pensador. Sem compreender o pensador e suas atividades, reformas sociais superficiais não têm significado - não para o homem verdadeiramente sério e zeloso. É importante que cada um de nós descubra isso - seja no plano superficial, no exterior, ou no plano fundamental e interno. (...)"

(J. Krishnamurti - O pensador precisa entender a si mesmo - Revista Sophia, Ano 2, nº 7 - p. 24/25)


segunda-feira, 16 de outubro de 2017

O PENSADOR PRECISA ENTENDER A SI MESMO (1ª PARTE)

"Certa vez me perguntaram por que meus ensinamentos são unicamente psicológicos, centrados na mente e seus afazeres, sem nenhuma teologia, ética, estética, sociologia ou ciência política. Isso acontece por uma razão muito simples. Se o pensador pode compreender a si mesmo, todos os problemas estão resolvidos. Ele é a criação e a realidade; tudo o que ele fizer será social.

A virtude não é um fim em si. Ela traz a liberdade, mas só pode existir liberdade se o pensador, que é a mente, deixar de existir. É por isso que temos que compreender os processos da mente, o ego, o eu e os desejos que criam o ego - minha propriedade, minha esposa, minhas ideias, meu Deus.

O pensador é confuso; por isso, suas ações são confusas. É também por isso que ele busca a realidade, a ordem e a paz. Por ser confuso e ignorante, ele quer o conhecimento; por estar cheio de contradições e conflitos, ele procura uma ética que o controle, guie e apoie.

Se eu, o pensador, puder compreender a mim mesmo, os problemas estarão resolvidos. Não serei antissocial; não explorarei os pobres para ser rico; não vou querer coisas e mais coisas, alimentando o conflito entre os que têm e os que não têm nada. Não pertencerei a uma casta, classe ou nacionalidade, porque não haverá separação entre os homens. Poderemos amar uns aos outros e sermos gentis.

Portanto, o que é importante não é a cosmologia a teologia ou a sociologia, mas compreender a mim mesmo: compreender o pensador. Mas será que o pensador é diferente de seus pensamentos? Se os pensamentos acabam, existe o pensador? A qualidade de pensar pode ser removida do pensador? Se ela for removida, o ego do pensador continuará a existir? (...)"

(J. Krishnamurti - O pensador precisa entender a si mesmo - Revista Sophia, Ano 2, nº 7 - p. 24)


domingo, 15 de outubro de 2017

VOCÊ ACREDITA NUMA VIDA DEPOIS DESTA?

"Sempre me intrigou que alguns mestres budistas que eu conhecia fizessem uma simples pergunta às pessoas que se aproximavam deles buscando ensinamento: 'Você acredita numa vida depois desta?' Não se trata de saber se a pessoa acredita nisso como uma proposição filosófica, mas se sente isso no fundo do seu coração. O mestre sabe que, se alguém acredita numa vida futura, sua visão de mundo será diferente e terá um outro sentido de responsabilidade e moralidade pessoal. O que os mestres suspeitam é que aqueles que não têm uma crença firme numa vida após a morte, vão criar uma sociedade fixada em resultados a curto prazo, sem qualquer preocupação com as consequências dos seus atos. Seria essa a principal razão pela qual criamos um mundo brutal como este em que vivemos, um mundo em que a verdadeira compaixão está quase ausente?

Às vezes penso que os países mais poderosos e influentes do mundo desenvolvido são como o reino dos deuses descrito nos ensinamentos budistas. Diz-se que esses deuses vivem suas vidas em meio a um luxo fabuloso, mergulhados em todos os prazeres imagináveis, sem um único pensamento sobre a dimensão espiritual da vida. Todos parecem muito felizes até que a morte se aproxima, e aí alguns sinais inesperados de desintegração aparecem. Então, as esposas e amantes desses deuses não mais se atrevem a se aproximar deles, atirando-lhes flores à distância, com preces ocasionais para que eles renasçam novamente como deuses. Nenhuma de suas lembranças de felicidade ou conforto pode agora protegê-los do sofrimento que eles enfrentam; isso só faz com que fiquem mais desesperados, de tal modo que esses deuses são deixados para morrerem sozinhos e miseravelmente.

O destino dos deuses me faz pensar na maneira como os velhos, os doentes e os que estão morrendo são tratados hoje. Nossa sociedade é obcecada por juventude, sexo e poder, e nós nos esquivamos da velhice e da decadência. Não é terrível que desprezemos as pessoas idosas quando sua vida de trabalho se encerrou e elas já não mais pareçam úteis? Não é perturbador que nós as joguemos em asilos, onde morrem solitárias e abandonadas? (...)"

(Sogyal Rinpoche - O Livro Tibetano do Viver e do Morrer - Ed. Talento/Ed. Palas Athena, 1999 - p. 26/27

sábado, 14 de outubro de 2017

ABANDONANDO O TEMPO PSICOLÓGICO (PARTE FINAL)

"(...) O que percebemos como futuro é uma parte intrínseca do nosso estado de consciência do momento. Se a nossa mente carrega um grande fardo do passado, vamos sentir isso. O passado se perpetua pela falta de presença. O que dá forma ao futuro é a qualidade da nossa percepção do momento presente, e o futuro, é claro, só pode ser vivenciado como presente. 

Se é a qualidade da nossa percepção neste momento que determina o futuro, então o que é que determina a qualidade da nossa consciência? O nosso grau de presença. Portanto, o único lugar onde pode ocorrer uma mudança verdadeira e onde o passado pode se dissolver é no Agora.

Talvez seja difícil reconhecer que o tempo é a causa do nosso sofrimento ou de nossos problemas. Acreditamos que eles são causados por situações específicas em nossas vidas, e, de um ponto de vista convencional, isso é uma verdade. Mas, enquanto não lidarmos com a disfunção básica da mente - o apego ao passado e ao futuro e a negação do presente -, os problemas apenas mudarão de figura.

Se todos os nossos problemas, ou causas identificadas de sofrimento ou infelicidade, fossem milagrosamente solucionadas no dia de hoje, sem que nos tornássemos mais presentes e mais conscientes, logo nos veríamos com um outro conjunto de problemas ou causas de sofrimento semelhantes, como uma sombra que nos seguisse aonde quer que fôssemos. Em última análise, o único problema é a própria mente limitada pelo tempo.

Não há salvação dentro do tempo. Você não pode se libertar no futuro.

A PRESENÇA É A CHAVE para a liberdade. Portanto, você só pode ser livre agora."

(Eckhart Tolle - Praticando o Poder do Agora - Ed. Sextante, Rio de Janeiro, 2016 - p. 35/36)


sexta-feira, 13 de outubro de 2017

ABANDONANDO O TEMPO PSICOLÓGICO (1ª PARTE)

"Aprenda a usar o tempo nos aspectos práticos da sua vida - podemos chamar de 'tempo de relógio' -, mas retorne imediatamente para perceber o momento presente, tão logo esses assuntos práticos tenham sido resolvidos. Assim, não haverá acúmulo do 'tempo psicológico', que é a identificação com o passado e uma projeção compulsiva e contínua do futuro.

Se estabelecemos um objetivo e trabalhamos para alcançá-lo, estamos empregando o tempo do relógio. Sabemos bem aonde queremos chegar, mas respeitamos e damos atenção total ao passo que estamos dando neste momento. Se insistimos demais nesse objetivo, talvez porque estejamos em busca de felicidade, satisfação ou de um sentido mais completo do eu interior, deixamos de respeitar o Agora. E ele é reduzido a um mero degrau para o futuro, sem nenhum valor intrínseco. O tempo do relógio se transforma então em tempo psicológico. Nossa jornada deixa de ser uma aventura e passa a ser encarada como uma necessidade obsessiva de chegar, de possuir, de 'conseguir'. Aí não somos mais capazes de ver nem de sentir as flores pelo caminho, nem de perceber a beleza e o milagre da vida que se revela em tudo ao redor, como acontece quanto estamos presentes no Agora.

Você está sempre tentando chegar a algum outro lugar além daquele onde você está? A maior parte do que você faz é apenas um meio para alcançar um determinado fim? A satisfação está sempre em outro lugar ou restrita a breves prazeres como sexo, comida, bebida e drogas, ou relacionada a uma emoção ou excitação? Você está sempre pensando em vir a ser, adquirir, alcançar, ou, em vez disso, está à caça de novas emoções e prazeres? Você acha que, quanto mais bens adquirir, uma pessoa se sentirá melhor ou psicologicamente completa? Está à espera de um homem ou de uma mulher que dê um sentido à sua vida?

No estado normal de consciência, o poder e o infinito potencial criativo do Agora estão completamente encobertos pelo tempo psicológico. Nossa vida perde a vibração, o frescor, o sentido de encantamento. Os velhos padrões de pensamento, emoção, comportamento, reação e desejo são encenados repetidas vezes, como um roteiro dentro da nossa mente que nos dá uma identidade, mas distorce ou encobre a realidade do Agora. A mente, então, desenvolve uma obsessão pelo futuro, buscando fugir de um presente insatisfatório. (...)"

(Eckhart Tolle - Praticando o Poder do Agora - Ed. Sextante, Rio de Janeiro, 2016 - p. 33/35)


quinta-feira, 12 de outubro de 2017

O MUNDO ASTRAL TEM MUITAS ESFERAS

"Quando acordamos de manhã, vemos que somos as mesmas pessoas que éramos antes de dormir. Igualmente, quando nós e nossos entes queridos acordamos no mundo astral, após a morte, somos exatamente os mesmos; só que, de modo geral, podemos ter uma aparência mais jovem e estar livres de doenças. 

Não nos tornamos anjos simplesmente por morrer. Se somos anjos agora, também o seremos no além. Se temos uma personalidade obscura e negativa, após a morte seremos do mesmo jeito. Assim como neste mundo existem favelas e paisagens bonitas, o mesmo acontece no outro mundo. Dependendo de como você viveu na Terra - se foi uma vida boa e pura ou má e feia - você irá para uma região melhor ou mais escura no mundo astral. Jesus falou dessas diferentes regiões: 'Na casa de meu Pai há muitas moradas'?⁷

Os planos astrais possuem várias atmosferas ou vibrações e cada alma que lá chega, proveniente da Terra, é atraída pela atmosfera que estiver em maior harmonia com sua vibração particular. Assim como os peixes vivem na água, os vermes abaixo do solo, o ser humano na superfície e os pássaros no ar, também as almas no mundo astral vivem na esfera que for mais adequada à sua vibração. Quanto mais nobre e espiritual for uma pessoa na Terra, mais elevada a esfera para a qual será atraída, e maior será sua liberdade, alegria e experiência de beleza.

Nos planetas astrais, os seres não dependem de ar ou eletricidade para existir; eles se alimentam de raios multicoloridos de luz. Há mais liberdade no mundo astral do que no mundo físico. Lá não há ossos para serem quebrados, pois não existem sólidos; tudo é feito de raios luminosos. E tudo é movido pelo poder do pensamento. Quando as almas no astral desejam fazer um jardim, basta querer, que o jardim se torna realidade, e ele aparece e permanece enquanto se quiser. Quando a alma quer que o jardim desapareça, ele se vai."

⁷ João 14:2.

(Paramahansa Yogananda - O Romance com Deus - Self-Realization Fellowship - p. 293/294)


quarta-feira, 11 de outubro de 2017

TEMPO E TRANSFORMAÇÃO (PARTE FINAL)

"(...) Nosso problema é: pode um conflito, uma perturbação ser superada num período de tempo - de dias, de anos, de vidas? Que acontece quando dizeis: 'vou praticar a não violência durante certo período de tempo'? O praticar, em si mesmo, indica que estais em conflito, não é verdade? Não praticarieis se não estivésseis resistindo ao conflito; dizeis que a resistência ao conflito é necessária, para que se possa dominar o conflito, e para essa resistência necessitais de tempo. Mas a própria resistência ao conflito é ainda uma forma de conflito. Estais consumindo vossa energia resistindo ao conflito, sob a forma que chamais ambição, inveja ou violência, mas vossa mente continua em conflito, e por isso importa perceber a falsidade do processo de dependência do tempo, como meio de dominarmos a violência e de nos livrarmos daquele processo. Podeis então ser o que sois: uma perturbação psicológica, a própria violência.

Para compreender qualquer coisa, qualquer problema humano ou científico, o que é importante, o que é essencial? Ter a mente tranquila, não é verdade? — ter a mente toda aberta à compreensão. Esta não é mente exclusiva, mente que procura concentrar-se, pois isto é, também, esforço de resistência. Se desejo, na realidade, compreender uma coisa, apresenta-se logo um estado mental tranquilo. Quando desejais ouvir música, ou contemplar um quadro que amais, um quadro que apreciais, qual é o estado de vossa mente? Há imediata tranqüilidade, não há? Quando escutais música, vossa mente não está divagando em todas as direções; está escutando. Idênticamente, quando desejais compreender o conflito, já não estais na dependência do tempo, mas apenas em presença do que é, do conflito. Vem então, de pronto, a tranqüilidade, a serenidade da mente. Quando não mais dependeis do tempo como meio de transformar o que é, por verdes a falsidade desse processo, estais então frente a frente com o que é, e visto que estais interessados em compreender o que é, tendes naturalmente a mente tranquila. Nesse estado mental vigilante, e ao mesmo tempo passivo, há compreensão. Enquanto a mente está em conflito, reprovando, resistindo, condenando, não haverá compreensão. Se desejo compreender-vos, não posso condenar-vos, é claro. É essa mente quieta, essa mente tranquila, que efetua a transformação. Quando a mente já não está resistindo, evitando, rejeitando, ou reprovando o que é, mas se acha simplesmente, passivamente, vigilante, então, nessa passividade da mente vereis - se de fato examinardes o problema - vereis como vem a transformação. 

A revolução só é possível agora, e não no futuro; a regeneração é hoje, e não amanhã. Se experimentardes o que estou dizendo, vereis que há regeneração imediata, um estado novo, uma qualidade nova, porque a mente está sempre tranquila quando está interessada, quando tem o desejo ou a intenção de compreender. A dificuldade, no que respeita à maioria de nós, é que não temos a intenção de compreender, pois receamos que a compreensão produza uma ação revolucionária em nossa vida, e por isso resistimos. Está em ação o mecanismo de defesa, quando empregamos o tempo ou um ideal como meio de gradativa transformação. 

A regeneração, pois, só é possível agora, e não no futuro, não amanhã. O homem que conta com o tempo como meio de alcançar a felicidade ou de conhecer a verdade ou Deus, está simplesmente enganando a si mesmo, está vivendo na ignorância e, por conseguinte, em conflito. O homem que reconhece não ser o tempo o caminho por onde sairá de suas dificuldades e que, por conseguinte, está livre do falso, esse homem, naturalmente, tem a intenção de compreender. Sua mente, portanto, está espontaneamente tranquila, sem compulsão, sem disciplina. Quando a mente está tranquila, serena, quando não está buscando resposta ou solução alguma, quando não está resistindo nem evitando, só então pode haver regeneração, porque a mente é assim capaz de perceber o que é verdadeiro. A verdade é que liberta, não o esforço que fazemos para libertar-nos."

(J. Krishnamurti - A Primeira e Última Liberdade - Ed. Cultrix, São Paulo - p. 114/115
http://www.pensamento-cultrix.com.br/


terça-feira, 10 de outubro de 2017

TEMPO E TRANSFORMAÇÃO (1ª PARTE)

"Desejo falar um pouco a respeito do tempo, porque acredito que a riqueza, a beleza e significação daquilo que é atemporal, daquilo que é verdadeiro, só podem ser experimentadas quando compreendemos integralmente o processo do tempo. Afinal de contas, estamos buscando, cada um à sua maneira, um sentimento de felicidade, de enriquecimento. Ora, uma vida que tem significado, que tem as riquezas da verdadeira felicidade, não está em relação com o tempo. Qual o amor, essa vida é atemporal e para compreendermos o que é atemporal, não devemos considerá-lo através do tempo, porém antes, compreender o tempo. Não devemos utilizar o tempo como meio de alcançar, compreender, apreender o atemporal. No entanto, é o que estamos fazendo, na maior parte da nossa vida: consumindo tempo, procurando aprender o que é atemporal - e por isso é importante compreender o que se entende por 'tempo', pois creio que é possível ser livre do tempo. É importantíssimo compreender o tempo como um todo e não por partes.

É interessante compreender que quase toda nossa vida se consome no tempo - tempo, não no sentido de sequência cronológica de minutos, horas, dias e anos, mas no sentido de memória psicológica. Vivemos pelo tempo, somos resultado do tempo. Nossas mentes são o produto de muitos dias passados, e o presente é apenas a passagem do passado para o futuro. Nossas mentes, nossas atividades, nosso ser, fundam-se no tempo. Sem o tempo, não podemos pensar, porque o pensamento é resultado do tempo, o produto de muitos dias passados, e não há pensamento sem memória. Memória é tempo, pois há duas espécies de tempo: o cronológico e o psicológico. Há o tempo, o ontem do relógio, e o ontem da memória. Não se pode rejeitar o tempo cronológico, pois seria absurdo: poderiamos perder o trem. Existirá realmente tempo, fora do tempo cronológico? É claro que há o tempo, o ontem, mas existe o tempo tal como a mente o concebe? Existe tempo, separado da mente? Não há dúvida que o tempo, o tempo psicológico é produto da mente. Sem a base do pensamento, não existe o tempo - sendo 'tempo' apenas a memória do dia de ontem em conjunção com o de hoje, moldando o amanhã. Quer dizer, a memória da experiência de ontem, em reação ao presente, está criando o futuro - o que constitui ainda um processo de pensamento, uma senda da mente. O processo de pensamento determina progresso psicológico no tempo, mas esse tempo será real, tão real como o tempo cronológico? Podemos utilizar esse tempo produzido pela mente, como meio de compreender o eterno, o atemporal? Como disse, a felicidade não é produto de ontem, a felicidade não é produto do tempo, a felicidade está sempre no presente, é um estado atemporal. Não sei se já notastes, que quando tendes um êxtase, uma alegria criadora - uma série de nuvens radiosas cercadas de nuvens negras - nesse momento não existe o tempo: só há o presente imediato. A mente, interferindo depois desse experimentar, do presente, lembra-se dele e deseja continuá-lo, acrescentando-se a si mesma, mais e mais, e criando assim o tempo. O tempo é criado pelo 'mais'; o tempo é aquisição e, também, renúncia, que é por sua vez uma aquisição da mente. Logo, disciplinar apenas a mente no tempo, condicionar o pensamento dentro da estrutura do tempo, que é memória, por certo não nos revela o que é atemporal. 

A transformação depende do tempo? Quase todos estamos acostumados a pensar que o tempo é necessário para a transformação: sou 'tal coisa', e para modificar o que sou e transformá-lo naquilo que deveria ser, é preciso tempo. Sou ambicioso, e dessa ambição resulta confusão, antagonismo, conflito, aflição. Para realizar a transformação, que é a não ambição, pensamos ser necessário o tempo. Isto é, consideramos o tempo como meio de evolvermos para algo superior, como meio de nos tornarmos alguma coisa. O problema é este: sou violento, ambicioso, invejoso, irascível, vicioso, ou apaixonado. Para transformar o que é, há necessidade de tempo? Em primeiro lugar, por que desejamos modificar o que é, efetuar uma transformação? Por quê? Porque o que é não nos satisfaz, o que é cria conflito, perturbações, e, como não gostamos desse estado, desejamos algo que seja melhor, mais nobre, mais idealístico. Assim, desejamos a transformação porque existe sofrimento, desconforto, conflito. O conflito pode ser dominado pelo tempo? Se dizeis que sim, continuais em conflito. Podemos dizer que bastarão vinte dias, ou vinte anos, para nos livrarmos do conflito, para modificarmos o que somos, mas durante esse tempo continuaremos em conflito, e por conseguinte, o tempo não efetua transformação alguma. Quando nos servimos do tempo como meio de adquirir uma qualidade, uma virtude, ou um 'estado de ser', estamos apenas adiando, estamos evitando o que é. Julgo importante compreender este ponto. A ambição, ou a violência, causam sofrimento e perturbações no mundo das nossas relações, que constituem a sociedade; cônscios deste estado de perturbação, que denominamos ambição ou violência, dizemos para nós mesmos: 'sairei dele com o tempo; praticarei a não violência, praticarei a não inveja; praticarei a paz'. Ora, desejais praticar a não violência, porque a violência é um estado de perturbação, de conflito, e pensais que com o tempo alcançareis a não violência e dominareis o conflito. Que está realmente acontecendo? Achando-vos em estado de conflito, desejais alcançar um estado em que não haja conflito. Ora, esse estado de não conflito é resultado do tempo, de uma duração? evidentemente não é; porque enquanto estais alcançando o estado de não violência, continuais violentos e, por conseguinte, em conflito. (...)"

(J. Krishnamurti - A Primeira e Última Liberdade - Ed. Cultrix, São Paulo - p. 111/114)
http://www.pensamento-cultrix.com.br/



segunda-feira, 9 de outubro de 2017

AS CHAVES DA FRATERNIDADE

 "Os quatro elos da cadeia dourada que deveria unir a humanidade, fazendo dela uma só família e uma fraternidade universal são: Unidade e Causalidade universais, Solidariedade humana, lei do Karma e Reencarnação. Como?

No estado atual da sociedade, particularmente nos países chamados civilizados, esbarramos continuamente com grandes massas que sofrem por efeito da miséria, da pobreza e das enfermidades. Suas condições físicas são miseráveis e suas faculdades mentais e espirituais frequentemente inativas. Por outro lado, muitas pessoas que ocupam o extremo oposto na escala social vivem indiferentes, entregues ao luxo material e à complacência egoísta. Nenhuma dessas formas de existência é fruto de pura causalidade, ambas são efeitos das condições que rodeiam aqueles que estão sujeitos a elas se o abandono do dever social por um lado tem relação muito íntima com o progresso interrompido do outro. Na Sociologia, como em todos os ramos da verdadeira ciência, a lei da Causalidade universal é exata, porém esta causalidade implica como consequência lógica à solidariedade humana, na qual muito insiste a Teosofia. Se a ação de uma pessoa provoca reflexos na vida de todas as demais e esta é a verdadeira ciência científica, então somente com a conversão de todos os homens em irmãos e praticando todos, diariamente, a verdadeira fraternidade é que se alcançará a solidariedade humana real em que se estriba e enraíza a perfeição da raça. Esta ação mútua, esta verdadeira fraternidade, em que cada um deve viver para todos e todos para um, consiste num dos princípios teosóficos fundamentais a que todo teósofo deveria obrigar-se não apenas a ensinar, mas a aplicar praticamente na vida."

(H. P. Blavatsky - A Doutrina Teosófica - Ed. Hemus, São Paulo - p. 87/88)


domingo, 8 de outubro de 2017

CARIDADE

"As ideias da Teosofia acerca da caridade significam esforço pessoal para os demais; compaixão e bondade pessoais; interesse pessoal no bem-estar e prosperidade dos que sofrem; previsão e ajuda pessoais em suas penas e necessidades. Os teósofos não acreditam na eficiência do sistema de dar dinheiro por intermediários; acreditam aumentar cem por cento o poder do dinheiro e sua eficácia pelo nosso contato e simpatia pessoais com os que o necessitam. Creem no alívio da alma tanto, se não mais, que aquele do estômago; porque o agradecimento promove maior bem naquele que o expressa que naquele que o fez sentir. Onde está o agradecimento que vossos milhões de libras esterlinas deveriam ter despertado ou os bons sentimentos provocados por eles? Por ventura no ódio que o pobre do East-End sente pelo rico? No aumento do partido da anarquia e da desordem ou nessas centenas de operárias, vítimas do sistema 'do suor' obrigadas a andar pelas ruas, diariamente, para ganhar o sustento? Acreditamos que um bom livro que oferece às pessoas matéria para pensar que fortalece e torna mais clara sua mente facilitando-lhes o entendimento de verdades sentidas de maneira vaga, porém sem que as pudessem formular, produz um bem real e substancial. 

Relativamente ao que chamais de atos práticos de caridade em favor de nossos semelhantes, fazemos o pouco que podemos, porém, como já disse, a maior parte de nossos irmãos é pobre e a Sociedade, por si mesma, não tem recursos suficientes para contratar gente dedicada a seu serviço. (...). Os poucos que reúnem condições de fazer o que se chama vulgarmente atos de caridade seguem os preceitos budistas e trabalham por si próprios, porém não por procuração ou subscrevendo publicamente a obras caritativas. O teósofo deve antes de mais nada esquecer sua personalidade." 

(H. P. Blavatsky - A Doutrina Teosófica - Ed. Hemus, São Paulo - p. 86/87)


sábado, 7 de outubro de 2017

O SACRIFÍCIO

"A Teosofia considera o sacrifício individual pelo bem de muitos como muito superior à abnegação por uma ideia sectária, como por exemplo a de 'salvar os pagãos da condenação'.

Em nossa opinião o Padre Damião (aquele jovem de trinta anos que sacrificou sua vida inteira para aliviar os sofrimentos dos leprosos de Molokai e que viveu durante dezoito anos sozinho com eles, sendo atacado pelo mal e morrendo) não se sacrificou inutilmente. Aliviou e proporcionou uma relativa felicidade a milhares de pobres desgraçados. Consolou-os mental e fisicamente, derramou um raio de luz na tenebrosa noite terrível de uma existência, cuja amargura não é comparável a nenhuma outra nos anais do sofrimento humano. Era um verdadeiro teósofo e sua memória viverá eternamente em nós. Consideramos esse pobre sacerdote belga incomensuravelmente mais elevado que, por exemplo, aqueles sinceros, porém insensatos e inúteis missionários que sacrificaram suas vidas nas ilhas dos mares do Sul ou na China. Que bem lograram fazer? Nas primeiras lidavam com seres ainda inaptos para a recepção de qualquer verdade e no segundo caso, tratava-se de uma nação cujos princípios de filosofia religiosa são tão elevados como quaisquer outros, se quisessem, aqueles que os possuem, seguir o modelo de Confúcio e outros sábios de sua raça. Morreram vítimas de canibais e de selvagens, ou do fanatismo e ódio populares; enquanto que se tivessem ido aos tugúrios de Whitechapel ou outra daquelas localidades que param e apodrecem sob o brilhante sol de nossa civilização, cheias de selvagens cristãos e de lepra mental, teriam podido executar um verdadeiro bem e ter conservado sua vida para uma causa melhor e mais digna.

Se dispuséssemos de meios para tanto, erigiríamos uma estátua do padre Damião, santo verdadeiro e prático, perpetuaríamos sua memória para sempre como exemplo vivo de heroísmo teosófico, de compaixão e autossacrifício budista e cristão...

Porém uma distinção deve ser estabelecida. Nenhum homem tem direito de deixar-se morrer de fome para que outro possa alimentar-se, a não ser que a vida deste último seja, de maneira evidente, de maior utilidade aos outros do que a sua. Porém é seu dever sacrificar seu próprio bem-estar e trabalhar pelos demais se estes são incapazes de fazê-lo. É seu dever dar tudo quanto tenha, completamente, se não tem serventia a ninguém além de si mesmo, no caso de guardá-lo egoisticamente. A Teosofia ensina a abnegação, porém não o autossacrifício impulsivo e inútil, nem justifica o fanatismo."

(H. P. Blavatsky - A Doutrina Teosófica - Ed. Hemus, São Paulo - p. 84/86)


sexta-feira, 6 de outubro de 2017

OS DEVERES

"O primeiro dos deveres teosóficos é o de cumprir o próprio dever para com todos os homens e principalmente com aquelas pessoas com as quais temos obrigações especiais, seja por tê-las assumido voluntariamente, como por exemplo os laços do matrimônio, seja por termos sido ligados a elas pelo destino, como as que devemos a nossos pais ou parentes. 

Deve-se reprimir e vencer ao seu inferior por intermédio do superior. Purificar-se interna e moralmente; não temer a ninguém nem a nada além do tribunal de sua própria consciência. Não fazer nada pela metade; isto é, quando se acredita fazer uma coisa boa, deve-se fazê-la aberta e francamente e se é má, apartar-se dela completamente. 'É dever de um teósofo aliviar sua carga pensando no sábio aforismo de Epitecto: Não te deixes apartar de teu dever por qualquer reflexão que possa fazer a teu respeito o néscio mundo, porque suas censuras não estão em teu poder e consequentemente não devem importar em nada...

Nenhum homem pode dizer que nada pode fazer pelos demais, sob nenhum pretexto. 'Cumprindo sua obrigação na ocasião conveniente, o homem pode tornar-se credor do mundo', disse um escritor inglês. Um jarro d'água oferecido a tempo ao viajante sedento é mais valioso e digno que uma dúzia de manjares oferecidos a pessoas que podem pagar por eles. Um homem que não sinta isso jamais será teósofo; poderá, entretanto, continuar sendo membro de nossa Sociedade. Não temos regras para obrigar um homem a ser um teósofo prático se este não deseja ser." 

(H. P. Blavatsky - A Doutrina Teosófica - Ed. Hemus, São Paulo - p. 83/84)


quinta-feira, 5 de outubro de 2017

O DEVER

"O dever é aquilo que se deve à Humanidade, a nossos semelhantes, a nossos vizinhos, à nossa família e especialmente o que devemos a todos aqueles que são mais pobres e desamparados que nós mesmos. Esta é uma dívida que não satisfeita durante a vida nos torna espiritualmente insolventes e cria um estado de quebra moral em nossa próxima encarnação. A Teosofia é a quintessência do dever... O que chamais 'deveres cristãos' foi inculcado por todos  os  grandes reformadores  morais e religiosos séculos antes da Era Cristã. Não se tratava antigamente de tudo o que era grande, generoso e heróico, sendo objeto, como hoje, de prédicas no púlpito e até mesmo por nações inteiras. A história budista está repleta dos atos mais nobres e mais heroicamente generosos. 'Sede todos uma só vontade; compadecei-vos uns dos outros: querei-vos como irmãos; sede misericordiosos, afáveis; não devolvei mal ao mal, ou injúria por injúria mas, sede bondosos'. Observaram praticamente esses preceitos os discípulos de Buda, alguns séculos antes de Pedro. A ética do Cristianismo é indubitavelmente grande, mas é também inegável que não é nova, e que nasceu do mesmo modo que os deveres pagãos... 

Os que praticam seu dever para com todos e somente pelo dever são poucos e ainda menor número é contado entre os que cumprem esse dever pelo contentamento de sua própria consciência... Formosa, para leitura e discussão, é a ética moderna, porém que são as palavras quando não se convertem em atos? Finalmente, se me perguntais de que modo compreendemos o dever teosófico posto em prática e relacionado com Karma, posso responder que nosso dever é o de beber, sem a mínima queixa, até a última gota de qualquer conteúdo que o destino nos ofereça na taça da vida; colher as rosas da vida tão somente pelo aroma que possam exalar para os outros e nos contentarmos tão somente com os espinhos se não podemos gozar daquele aroma sem privar dele um outro ser. 

Não se trata do que nós, membros da Sociedade Teosófica, fazemos - ainda que alguns de nós façam tudo quanto possam - mas sim de que a Teosofia nos leva mais longe no caminho do bem do que o faz o Cristianismo moderno. A ação esforçada e leal é o que digo, não a simples intenção e as palavras! Um homem pode ser o que quiser; o mais mundano egoísta e duro de todos os homens e até o maior canalha e isto não lhe impedirá de arrogar-se o nome de cristão, nem tampouco a um outro de considerá-lo como tal. Porém nenhum teósofo tem direito a esse nome se não está inteiramente imbuído do axioma de Carlyle: 'O objeto do homem é um ato e não um pensamento, ainda que este fosse o mais nobre' e se não amolda sua vida diária a esta verdade... 

A felicidade, ou melhor, a satisfação pode ser consequência para o cumprimento do dever, mas não é nem deve ser o motivo para isso."

(H. P. Blavatsky - A Doutrina Teosófica - Ed. Hemus, São Paulo - p. 82/83)


quarta-feira, 4 de outubro de 2017

ALMA E ESPÍRITO

"Platão define a alma (Buddhi) como 'o movimento capaz de mover a si próprio'. 'A alma, acrescenta (Leis, X), é a mais antiga das coisas e o princípio do movimento', chamando assim a Atma (Buddhi) de 'alma' e a Manas de 'Espírito', o que também é feito por nós. 

'A alma foi criada antes que o corpo e este é posterior e secundário, sendo, de acordo com natureza, governado pela alma. A alma que rege todas as coisas que se movem em todas as direções, rege igualmente os céus. A alma, consequentemente, governa as coisas no céu e na terra, bem como no mar, por seus movimentos cujos nomes são: querer, considerar, vigiar, consultar, opinar justa ou erroneamente, ter alegria, confiança, medo, ódio, amor, juntamente com todos os movimentos primitivos unidos a estes. Sendo uma deusa, tem sempre a Noûs, um deus, como aliado e ordena as coisas de forma correta e feliz; porém, quando se une a Annóia (negação de Noûs) trabalha sempre em sentido oposto nas coisas.' 

Nesta linguagem, bem como nos textos budistas considera-se o negativo como existência essencial. O aniquilamento é explicado de uma forma semelhante. O estado positivo é o ser essencial, porém não a manifestação como tal. Em linguagem budista quando o espírito entra no Nirvana perde a existência objetiva, porém conserva o ser subjetivo. 

Em sua dedução filosófica 'acerca dos sonhos', Aristóteles expõe com a maior clareza esta doutrina da alma dupla, ou seja, alma e espírito. 'É preciso que averiguemos em que porção da alma aparecem os sonhos', diz ele. Todos os antigos gregos acreditavam que no homem existia não uma alma dupla, mas sim tripla. E encontramos também a Homero designando por thumos à alma astral ou alma animal chamada 'espírito" por Draper e à divina: noûs, nome pelo qual também é denominado, por Platão, o espírito mais elevado. 

Os jainistas acreditam que a alma, à qual dão o nome de Jiva, tenha sido unida desde a eternidade a dois corpos etéreos e sublimados, um dos quais é invariável e formado dos poderes divinos da alma mais elevada; o outro variável e composto das mais grosseiras paixões do homem, de suas afecções sensuais e atributos terrestres. Quando a alma foi purificada depois da morte une-se a seu Vaycarica ou espírito divino e converte-se num deus. Os partidários dos Vedas, os sábios Brâmanes expõem a mesma doutrina nos Vedanta. A alma, segundo seus ensinamentos, como uma parte do divino espírito universal ou inteligência é capaz de se unir com a essência de sua Entidade mais elevada. 

Este ensinamento é explícito, os Vedanta afirmam que todo aquele que lograr conhecimento completo de seu deus se converte em deus, ainda que permaneça em seu corpo mortal, e adquire poder sobre todas coisas. Citando da teologia védica o verso que diz: 'Verdadeiramente existe apenas uma Divindade, o Espírito Supremo, ele é da mesma natureza que a alma do homem', Draper mostra como as doutrinas budistas chegaram à Europa Oriental através de Aristóteles. Consideramos esta afirmativa pouco digna de crédito, posto que Pitágoras e depois dele, Platão, ensinaram-nas muito anteriormente a Aristóteles. Se posteriormente os últimos platônicos admitiram em sua dialética os argumentos aristotélicos acerca da emanação foi unicamente porque suas opiniões coincidiam em alguns pontos com aquelas dos filósofos orientais."

(H. P. Blavatsky - A Doutrina Teosófica - Ed. Hemus, São Paulo - p. 49/51)


terça-feira, 3 de outubro de 2017

INDIVÍDUO E PERSONALIDADE

"Distinguimos entre o fato simples de nossa própria consciência o sentimento de que 'Eu sou' e o pensamento completo de que 'Sou o senhor Tal' ou 'A Senhora Tal'

Crendo como cremos, numa série de nascimentos para o mesmo Ego, ou reencarnação; esta distinção é o eixo fundamental de toda a ideia. Vemos que 'Senhor Tal', significa, na verdade, uma grande série de experiências diárias, todas reunidas pela continuidade da memória, formando aquilo que o senhor Tal chama 'meu eu'. Porém nenhuma dessas 'Experiências' é, realmente, o 'Eu' ou 'Ego', nem produz no Senhor Tal a sensação de ser ele mesmo, posto que esquece a maior parte de suas experiências diárias e produz o sentimento de ipseidade tão somente enquanto dura. Nós, os teósofos, distinguimos portanto, entre este conjunto de 'Experiência' que chamamos a falsa personalidade - por ser tão fugaz e finita - e aquele elemento do homem ao qual se deve o sentimento do 'Eu sou eu'

Este 'Eu sou eu' é a verdadeira individualidade para nós e sustentamos que esse 'Ego' ou individualidade representa, como o autor nos palcos, muitos papéis no teatro da vida, consideramos cada nova vida do 'Ego' na Terra como uma representação distinta no palco de um teatro. Aparece o ator, ou 'Ego' uma noite como 'Macbeth', a seguinte como 'Shylock', a terceira como 'Romeu', a quarta como 'Hamlet' ou 'Rei Lear' e assim sucessivamente até que tenha percorrido todo o ciclo de encarnações. O Ego começa sua peregrinação vital em papéis muito secundários como aquele de um espectro, de um 'Ariel' ou um 'Duende', representa a seguir um papel coadjuvante: é um soldado, um criado, um corista; logo ascende a 'papéis falados'; desempenha papéis principais alternadamente com outros insignificantes, até que finalmente se despede da cena como 'Próspero', o mago."

(H. P. Blavatsky - A Doutrina Teosófica - Ed. Hemus, São Paulo - p. 47/48)


segunda-feira, 2 de outubro de 2017

RELAÇÕES E ISOLAMENTO (PARTE FINAL)

"(...) O processo de isolamento está ligado à busca de poder. Quer estejamos buscando o poder individualmente, quer para um grupo racial ou nacional, haverá isolamento, porque o próprio desejo de poder, de posição, é separatismo. Afinal, é isso o que cada um deseja, não é verdade? Cada um quer ocupar uma posição poderosa, uma posição de domínio, seja no lar, seja no escritório, seja num regime burocrático. Procura cada um o poder e nessa busca de poder fundará uma sociedade baseada no poder - militar, industrial, econômico, etc. - o que também é evidente. O desejo de poder não é, por sua própria natureza, causador de isolamento? Julgo muito importante compreender isso, porque o homem que deseja um mundo pacífico, um mundo em que não haja guerras, não haja destruição e miséria, em escala aterradora, imensurável, deve compreender esta questão fundamental. Um homem afetuoso, benevolente, não tem espírito de poderio e portanto não está ligado a nacionalidade nem a bandeira alguma. Esse homem não tem bandeira. 

Não há coisa tal como viver no isolamento; nenhum país, nenhum povo, nenhum indivíduo pode viver no isolamento. Entretanto, porque estais em busca de poder, de tantas maneiras diferentes, criais o isolamento. O nacionalista é uma praga, porque, com seu espírito nacionalista, patriótico, está construindo uma muralha de isolamento. Tão identificado está com seus país, que ergue uma muralha contra outro país. Que acontece quando construís uma muralha contra alguma coisa? Essa coisa fica a chocar-se constantemente contra vossa muralha. Quando resistis a uma coisa, essa própria resistência indica que estais em conflito com ela. O nacionalismo, por consequência, que é um processo de isolamento, que é um resultado da busca de poder, não pode trazer paz ao mundo. O homem que é nacionalista e fala de fraternidade, está mentindo, está vivendo em estado de contradição. 

Pode-se viver no mundo sem o desejo de poder, de posição, de autoridade? Pode-se, é claro. Vivemos assim quando não nos identificamos com uma coisa 'maior'. Esta identificação com uma coisa 'maior' - o partido, a pátria, a raça, a religião, Deus é busca de poder. Porque vós mesmos sois vazios, embotados, sois fracos, gostais de identificar-vos com uma coisa maior. Esse desejo de identificação com uma coisa maior é desejo de poder. 

As relações são um processo de autorrevelação e se, desconhecendo a nós mesmos, desconhecendo as tendências da nossa mente e do nosso coração, procuramos apenas estabelecer uma ordem externa, um sistema, uma fórmula engenhosa, o que estabelecermos terá muito pouca significação. O importante é que compreendamos a nós mesmos em relação com outros. As relações se tornam, assim, não um processo de isolamento, mas um processo no qual descobrimos nossos próprios 'motivos', nossos próprios pensamentos, nossos próprios desígnios; e esta descoberta é o começo da libertação, o começo da transformação."

(J. Krishnamurti - A Primeira e Última Liberdade - Ed. Cultrix, São Paulo - p. 91/92)
http://www.pensamento-cultrix.com.br/


domingo, 1 de outubro de 2017

RELAÇÕES E ISOLAMENTO (1ª PARTE)

"A vida é experiência, experiência em relação. Não se pode viver no isolamento; a vida, portanto, é relação, e relação é ação. E como adquirir a capacidade de compreender as relações, que é a vida? Não significam as relações, não só comunhão com pessoas, mas também intimidade com coisas e idéias? A vida são relações, que se expressam no contato com coisas, pessoas, ideias. Compreendendo as relações, teremos capacidade para enfrentar a vida de maneira completa, adequada. Nosso problema, portanto, não é ter capacidade — pois esta não é independente das relações — porém, antes, compreender as relações, o que naturalmente produzirá a capacidade de pronta flexibilidade, pronto ajustamento, pronta reação. 

As relações, sem dúvida, são um espelho em que nos descobrimos. Sem relações não existimos. Ser é estar em relação, estar em relação é existir. Só existis em relação, de outro modo não existis, a existência nada significa. Não é porque pensais, que existis, que vos tornais existentes.¹ Existis porque estais em relação, e é a falta de compreensão das relações que causa conflito. 

Ora, não há compreensão das relações porque nos servimos delas apenas como meio de promover alguma realização, promover transformação, promover o 'vir a ser'. Mas as relações são um meio de autodescobrimento, porque estar em relação é ser, é existência. Sem relações, não existo. Para compreender a mim mesmo, preciso compreender as relações. As relações são um espelho, em que posso ver-me, a mim mesmo. Esse espelho pode deformar ou refletir fielmente o que é. Mas a maioria de nós vê nas relações as coisas que prefere ver; não vê o que é. Preferimos idealizar, fugir, preferimos viver no futuro, a compreender aquelas relações no presente imediato. 

Ora, se examinarmos nossa vida, as relações existentes entre nós, veremos que elas constituem um processo de isolamento. Não estamos verdadeiramente interessados uns nos outros; embora falemos muito a esse respeito, não estamos de fato interessados. Só estamos em relação com alguém enquanto essas relações nos agradam, enquanto nos proporcionam um refúgio, enquanto nos satisfazem. No momento em que ocorre qualquer perturbação, causadora de desconforto para nós, abandonamos essas relações. Em outras palavras, só há relações enquanto estamos satisfeitos. Isso pode parecer uma maneira rude de falar, mas se examinardes realmente vossa vida, com muita atenção, vereis que é um fato. Evitar um fato é viver na ignorância, que nunca pode produzir relações corretas. Se examinarmos nossas vidas e observarmos nossas relações, veremos que elas são um processo de criação de mútua resistência, de uma muralha por sobre a qual nos olhamos e observamos, uns aos outros. Conservamos sempre a muralha e permanecemos atrás dela, quer seja da muralha psicológica, quer seja da material, da muralha econômica, da muralha nacional. Enquanto vivermos no isolamento, atrás da muralha, não há relações entre nós. Vivemos fechados, porque achamos muito mais agradável, muito mais seguro. O mundo está tão fracionado, há tanto sofrimento, tanta dor, guerra, destruição, miséria, que desejamos fugir e viver dentro das muralhas protetoras de nosso ser psicológico. As relações, pois, no caso de quase todos nós, são, de fato, um processo de isolamento, e é bem óbvio que tais relações criam uma sociedade, também causadora de isolamento. E isso, exatamente, o que está acontecendo no mundo inteiro: vós permaneceis no vosso isolamento, e estendeis a mão por cima da muralha, chamando a isso nacionalismo, fraternidade, ou o que quiserdes, mas o fato é que continuam a existir os governos soberanos, com seus exércitos. Enquanto apegados às vossas limitações, pensais poder criar a unidade mundial, a paz mundial — coisa de todo impossível. Enquanto tiverdes uma fronteira nacional, econômica, religiosa, ou social, é bem claro que não pode haver paz no mundo. (...)"

¹ Foi o que disse Descartes: Penso, logo existo. (cogito ergo sum) (N. do T.)

(J. Krishnamurti - A Primeira e Última Liberdade - Ed. Cultrix, São Paulo - p. 89/91)
http://www.pensamento-cultrix.com.br/


sábado, 30 de setembro de 2017

NÃO SE APEGAR NEM À VERDADE

"Buda ensinou que estar apegado a uma coisa, 'sob um ponto de vista', e desprezar outras coisas, 'outros pontos de vista', chama-se vínculo.

Certa vez Buda explicou a seus discípulos a doutrina de causa e efeito, e eles disseram que a viam e a compreendiam claramente. Então disse: - Ó bhikkhus, esse ensinamento, que compreendeis de uma maneira tão pura e clara, se vos apegais a ele e o guardais como a um tesouro, então não compreendeis que o ensinamento é semelhante a uma jangada que é feita para um determinado fim, e não para ser continuamente carregada às costas. - E, assim, deu o seguinte exemplo: Um homem, viajando, chega à margem perigosa e assustadora de um rio de vasta extensão de água. Então vê que a outra margem é segura e livre de perigo. Pensa: 'Esta extensão de água é vasta e esta margem é perigosa, aquela é segura e livre de perigo. Não há embarcação nem ponte com que eu possa atravessar. Acho que seria bom juntar troncos, ramos e folhas e fazer uma jangada com a qual, impulsionada por minhas mãos e meus pés, passe com segurança a outra margem.' Então esse homem executa o que imagina, utilizando-se de suas mãos e seus pés, e passa para a margem oposta sem perigo. Tendo alcançado a margem oposta, ele pensa: 'Esta jangada me foi muito útil e me permitiu chegar a esta margem. Seria bom carregá-la à cabeça ou às costas onde quer que eu vá.' 

- Que pensais, bhikkhus? Procedendo dessa forma, esse homem agiria adequadamente em relação à jangada? - Não, Senhor! - responderam os bhikkhus.

- Como agiria ele adequadamente em relação a jangada? Tendo atravessado para a outra margem, esse homem deveria pensar: 'Esta jangada me foi de grande auxílio e graças a ela cheguei com segurança; agora seria bom que eu a abandonasse à sua sorte e seguisse o meu caminho livremente.' 

Assim, lembrou aos monges, contra um dogmatismo excessivo: 'A doutrina se assemelha à jangada; deve ser considerada não como um fim, mas como um meio; da mesma forma, a jangada é um meio para atravessar, mas não para se apegar. (Majjhima-Nikaya I.)

Com esta parábola ficou claro que Gautama Buda era um instrutor prático; só ensinava o que era útil e o que poderia trazer paz e felicidade ao homem, não dando atenção à especulação intelectual. Achava indispensável ter um ponto de vista não egocêntrico e impessoal, único capaz, aos seus olhos, de amenizar os inevitáveis sofrimentos da vida."

(Dr. Georges da Silva e Rita Homenko - Budismo, Psicologia do  Autoconhecimento - Ed. Pensamento, São Paulo - p. 19/20)


sexta-feira, 29 de setembro de 2017

INTELECTO

"Você é um intelectual desses que empenham o nobre talento de que é gerente em estudar, pesquisar, se esclarecer, em buscar ávida e diligentemente a Verdade?

Você tem se apercebido de que, com seu talento, pode melhorar-se e, melhorar as pessoas e a sociedade como um todo, trabalhando arduamento no plano das ideias e ideais, levando propostas e luzes àqueles que, menos dotados intelectualmente, são passíveis de influências (benéficas ou maléficas)?

Há ainda muito que descobrir, entender, conhecer, e, em consequência, propor, ensinar, passar aos demais.

Veja seu bem-dotado intelecto como um poderoso instrumento para sua elevação e a de um número incalculável de pessoas.

Seja vigilante e empenhado no uso de sua inteligência.

Protege, Senhor, de equívocos, dogmas e outras formas de impurezas o meu intelecto. 
Que possa eu, cada vez mais, entender e melhor pensar."

(Hermógenes - Deus investe em você - Ed. Nova Era, Rio de Janeiro, 1995 - p. 88)


quinta-feira, 28 de setembro de 2017

IMAGEM DA ETERNIDADE

"A Teoria da Relatividade surgiu depois da época de Helena Blavatsky. Mas ela já considerava o tempo multidimensional, com muitos aspectos que dependem da nossa observação. Nossas ideias sobre o tempo, originadas das nossas sensações, estão 'inelutavelmente vinculadas à relatividade do conhecimento humano.' e vão se desvanecer quando evoluirmos ao ponto de ver além da existência fenomênica.

Segundo Blavatsky, a duração ilimitada, ou atemporalidade, além da relatividade, é o 'tempo incondicionalmente eterno e universal', o númeno do tempo, não condicionado pelos fenômenos que surgem e desaparecem periodicamente. A duração é 'eterna e, portanto, imóvel, sem começo, sem fim, além do tempo dividido e além do espaço'.

É esse aspecto da realidade que produz o tempo como 'a imagem móvel da eternidade', nas palavras de Platão. Os ciclos de manifestação ocorrem dentro da duração infinita, à medida que o atemporal dá origem ao tempo. Assim como ocorre com o espaço e o movimento, nosso mundo familiar de tempo 'dividido' é gerado a partir desse reino indiviso e informe.

A duração abarca tudo simultaneamente, enquanto o tempo que experimentamos precisa se adaptar à visão sequencial: uma coisa de cada vez. É difícil imaginar a realidade como um todo presente simultaneamente na duração, porque nossa mente é parte do processo do tempo. A atemporalidade nos escapa.

Blavatsky explica que aquilo que é visto em um momento específico é a soma de todas as suas diferentes condições, desde o seu surgimento em forma material até o seu desaparecimento da Terra. Ela compara esse somatório com uma barra de metal lançada ao mar. O momento presente de uma pessoa é representado pela seção transversal da barra, no ponto em que o oceano e o ar se encontram. Ninguém diria que a barra surgiu no momento em que deixou o ar ou que desapareceu quanto entrou na água. Da mesma forma, surgimos do passado para mergulhar no futuro, apresentando, momentaneamente, uma faceta de nós mesmos no presente."

(Tempo e atemporalidade - Do livro Sabedoria Antiga e Visão Moderna, Shirleu Nicholson, Ed. Teosófica - Revista Sophia, Ano 2, nº 7 - p. 17)
www.revistasophia.com.br


quarta-feira, 27 de setembro de 2017

UMA PROPRIEDADE DA MENTE (PARTE FINAL)

"(...) As crianças ficam à vontade com o tempo não linear; ao brincar, parecem abolir o relógio. Nós também podemos modificar nossas sensações sobre  o tempo e torná-lo mais lento. Com isso, os processos biológicos também ficam mais lentos e saudáveis. A 'doença da pressa' pode ser revertida através das chamadas 'terapias do tempo', de acordo com Dossey. Isso pode ser feito por meio de técnicas como biofeedback, meditação, hipnose, jogos criativos e visualização de fantasias.

Nessas experiências, passado, presente e futuro se fundem, o que libera as pressões do tempo e quebra momentaneamente o seu domínio sobre nossa vida. Essas práticas também tendem a modificar nosso conceito linear do tempo como algo que avança inexoravelmente para a frente. Podemos aprender a sair dessa prisão e viver um 'presente em fluxo eterno', sentindo a atemporalidade da duração.

Quando não estamos mais dominados pelo tempo linear, vivemos em harmonia os aspectos cíclicos do tempo. Para as pessoas que vivem mais próximas à natureza, os ciclos das estações, do dia e da noite, as fases da lua, o plantio e a colheita - e nossos ciclos internos, como vigília e sono, respiração, menstruação - desempenham um papel importante. O tempo, para essas pessoas, é moldado por eventos recorrentes; a vida se ordena de acordo com ritmos naturais, em vez da segmentação artificial dos relógios.

Para essas pessoas, o tempo é um processo dinâmico e interminável, que retorna continuamente - uma espiral, em vez de um rio. O ritmo do viver representa a preservação do princípio dos ciclos, que a teosofia e a filosofia oriental traduzem como uma espécie de movimento circular por toda a realidade manifestada. Viver em harmonia com os ciclos é estar em harmonia com o universo."

(Tempo e atemporalidade - Do livro Sabedoria Antiga e Visão Moderna, Shirleu Nicholson, Ed. Teosófica - Revista Sophia, Ano 2, nº 7 - p. 16/17)


terça-feira, 26 de setembro de 2017

UMA PROPRIEDADE DA MENTE (1ª PARTE)

"Helena Blavatsky, assim como muitos filósofos, viu que o tempo, como sucessão de eventos, é tanto uma propriedade da nossa mente quanto uma parte da realidade. Nós percebemos de forma seriada e classificamos como passado, presente e futuro; os eventos, entretanto, simplesmente são.

O tempo é uma generalização, um conceito que formulamos a partir da experiência. Depois atribuímos a ele uma existência separada da nossa vivência dos eventos. Blavatsky, contrariando a noção de que o tempo flui e nós permanecemos parados, afirma que 'o tempo é apenas uma ilusão produzida pelos sucessivos estados da nossa consciência, à medida que atravessamos a duração eterna'.

A forte tendência de ordenar as coisas em sequência atua sobre a nossa percepção do mundo. O sentido de tempo linear fragmenta o panorama ininterrupto das mudanças interconectadas da natureza, percebido claramente pelos índios hopi.

Quando sonhamos ou mergulhamos em pensamentos o tempo pode se expandir, de modo que minutos ou segundos parecem horas, ou horas passam num relance. A sensação de passagem rápida ou lenta do tempo pode resultar de fatores físicos, como temperatura corporal, temperatura do ar ou influência de café, chá ou álcool, ou ainda fatores psicológicos como tédio ou interesse. É comum sentir que a semana de trabalho se arrasta, enquanto os fins de semana 'passam voando'.

A 'progressão ordenada, militar, do tempo medido' é muito diferente do 'tempo ilimitado da mente', segundo as expressões de Bérgson. Para alguns o tempo normalmente parece fluir mais lentamente do que para outros. Ao longo do dia, nossa percepção do passar do tempo também muda. Há momentos em que ele é uma corrente que se desloca montanha abaixo; depois, é como um rio sereno na planície. Nenhum dos padrões está 'correto'; o tempo não possui velocidade absoluta. Mas a pressa excessiva pode ser prejudicial e o ritmo lento pode ter efeitos curativos sobre nossa saúde. (...)"

(Tempo e atemporalidadeDo livro Sabedoria Antiga e Visão Moderna, Shirleu Nicholson, Ed. Teosófica - Revista Sophia, Ano 2, nº 7 - p. 16)


segunda-feira, 25 de setembro de 2017

O PERIGO DE UMA IMAGINAÇÃO INDISCIPLINADA

"Consideremos o caso de um homem que anseia por bebida. Ele conhece o sofrimento que a sua fraqueza lhe ocasiona; sabe que utiliza mal seu salário e deixa sua família à míngua; e, em seus momentos de lucidez, resolve abandonar aquele vício. Então ele passa por diante de uma taberna, vê sair e entrar gente, e talvez ainda sinta o odor de bebida. Até aquele momento, esteve livre da tentação e da consequente luta. Mas, que sucede agora? Naquela fração de segundo, se imagina bebendo - cria uma imagem mental; e por um momento vive e atua naquela forma mental como se, com efeito, usufruísse da bebida. Experimenta a possível satisfação de sua ânsia, mas em realidade não faz mais que intensificá-la, tornando a ação quase inevitável. Uma vez produzida a imagem, evoca tardiamente sua vontade dizendo: 'Não quero fazer isso'. Mas já é demasiado tarde, e a luta é praticamente em vão. Uma vez criada a imagem mental, segue-se geralmente a consumação da mesma em ação. Sem dúvida, às vezes, a imagem não é bastante vigorosa, e é possível repeli-la. Mas mesmo assim há luta, desgaste dos corpos e sofrimento como resultado. O melhor caminho é impedir que se forme a criadora imagem mental e intervir quando ainda seja eficaz a intervenção.

A imaginação indisciplinada causa sofrimento mais graves do que se supõe. As inumeráveis ocasiões em que tantos não puderam dominar suas paixões, expecialmente a luxúria, foram resultado de uma imaginação indisciplinada e não de uma vontade fraca. Pode-se sentir um forte desejo, mas é o pensamento criador que acarretará a ação.

A maioria das pessoas não dá importância a suas imaginações, devaneios ou pensamentos, e pensam que eles sejam inofensivos por não serem tangíveis ou visíveis à visão ordinária. Contudo, constituem o único perigo. A quem experimente um intenso desejo sexual, não haverá perigo em ver ou pensar no objeto de seu desejo, a menos que ao pensamento acompanhe a imagem mental de estar saciando seu apetite. O risco começa quando se imagina a si mesmo em ato de satisfação do desejo e quanto se consente que o desejo fortaleça a imagem criada. 

Um homem pode estar rodeado de objetos de desejo e, contudo, não experimentar perturbação nem dificuldade alguma, contanto que não permita que sua imaginação, seu poder mental criador, reaja a tais objetos. Nunca temos suficiente percepção de que os objetos de desejo não têm por si poder algum, a menos que nos permitamos reagir a eles, a menos que busquemos saciá-los em imagens criadoras. Mas, uma vez que o tenhamos feito, a luta sobrevém certamente. Consideramos o que pensamos como nossa vontade, e tentamos escapar dos resultados de nossa própria imaginação por meio de uma resistência frenética. Poucos compreenderam que a resitência agitada e ansiosa inspirada pelo medo é algo muito diferente da Vontade."

(J. J. Van Der Leeuw - Deuses no Exílio - Ed. Teosófica, Brasília, 2013 - p. 29/30)


domingo, 24 de setembro de 2017

A MUDANÇA NO CORPO MENTAL

"Consideremos agora o corpo mental e sua completa mudança. Em certos aspectos, a mudança a ser buscada no corpo mental é a mais essencial de todas, porque nele estão nossas reais possibilidades de perigo, embora o desconheçamos.

Nunca agimos nem falamos sem que antes tenhamos pensado, sem antes haver concebido uma imagem, isto é, sem haver 'imaginado' o que vamos fazer. Contudo, não atentamos para isso porque as operações da mente são tão rápidas - e nossa consciência é para nós um terreno tão desconhecido - que ignoramos o que ali sucede. Porém, mesmo antes de levantar a mão, pensamos nesse movimento, produzimos uma imagem dele; e como essa imagem é criadora, concretiza-se em ação.

O pensamento humano é a manifestação do Espírito Santo, o Deus Criador, cuja suprema Energia criadora se manifesta em nossa força mental, tornando-a uma espada de dois gumes, muito mais perigosa para quem desconhece o seu poder. Ao pensar, geramos uma imagem no corpo mental, criamos uma forma e a preenchemos com a Energia divina criadora, que então se lançará em ação. Às vezes, necessita-se de certo número de repetidos pensamentos para que a carga de Energia criadora seja suficiente para trazer uma ação. Quando frequentemente repetidos, os pensamentos criam um hábito ou costume; e muitas vezes ficamos impotentes para resistir àquilo que nós mesmos criamos.

Nada disso representa perigo se nós determinamos nossas imagens mentais a partir do interior, se nós - o Ser divino - criamos as imagens com plena consciência. O perigo, o terrível perigo de toda a nossa vida, está em permitirmos a criação de imagens mentais para incitações externas, em tolerar que os estímulos do mundo exterior concebam imagens no corpo mental; em lançar a criadora matéria mental em formas de pensamentos que, carregadas de energia, terão necessariamente que ser descarregadas, concretizando-se em ação.

Nessa indisciplinada atividade do corpo mental está a causa de praticamente todas as nossas lutas internas e dificuldades espirituais. É a ignorância que permite o funcionamento desgovernado do instrumento, que deveria ser útil a nós e não se utilizar de nossa energia criadora. Quando consentimos que os estímulos do exterior motivem o corpo mental a produzir imagens, nos desnorteamos, e começa a luta."

(J. J. Van Der Leeuw - Deuses no Exílio - Ed. Teosófica, Brasília, 2013 - p. 28/29)
www.editorateosofica.com.br


sábado, 23 de setembro de 2017

A MUDANÇA NO CORPO EMOCIONAL (PARTE FINAL)

"(...) Em verdade, isso torna-se muito diverso quando o verdadeiro Ser determina quais sentimentos devem se manifestar e conscientemente deixa fluir essas elevadas emoções através do corpo astral. Em vez de o agitarem flutuantes e nebulosas emoções que mudam a cada momento, será um corpo radiante, que emite firmemente as emoções determinadas pelo Ego e que palpita ritmicamente sob os impulsos interiores.

Também à visão clarividente, muito diferente se torna assim o corpo emocional: em vez de turvas manchas de cor, nossas emoções se mostram claramente definidas e concentricamente ordenadas, irradiando vigorosamente do centro do corpo emocional. Dessa forma, nesse corpo se opera mudança análoga à efetuada no físico.

Nesse caso cabe ainda comparar a mudança operada à que se observa numa massa de limalha de ferro quando submetida à influência de um campo magnético. No corpo emocional modificado há uma vontade central, dominante e diretora, e consequentemente ele agora é vitalizado e definido pela Vontade interior. Já é nosso servo, e nenhuma agitação, emoção ou incitação vindas  do exterior poderão despertar-lhe sentimentos ou desejos que já não consentimos. Já não é mais parte integrante do mundo astral circundante, mas apartou-se dele para se harmonizar com o Ser interno. Mudou a polaridade; é agora energizado a partir do interior, e irradia incessantemente emoções superiores em auxílio ao mundo. 

Ao efetuar essa mudança no corpo emocional, teremos cumprido outra etapa na superação daquela dualidade entre o Eu superior e o eu inferior, a qual tanto nos atribulou no passado e que provinha de nossa ignorância em consentir que uma parte de nossa consciência fosse dominada pelos corpos. Retiramos o centro de consciência do corpo astral ao submetê-lo ao Ser interno; desembaraçamos, por assim dizer, a consciência do corpo em que estava enredada, e a conduzimos um passo mais próximo ao mundo a que pertence, ao mantermos assim o corpo astral vitalizado a partir do interior, mantendo-o nosso servo."

(J. J. Van Der Leeuw - Deuses no Exílio - Ed. Teosófica, Brasília, 2013 - p. 27/28)


sexta-feira, 22 de setembro de 2017

A MUDANÇA NO CORPO EMOCIONAL (1ª PARTE)

"Quando mudamos nossa atitude a respeito do corpo físico, lhe retiramos o centro da consciência. É claro que não a retiramos inteiramente, porque senão ficaríamos adormecidos ou em estado de transe. Mas já não a temos no corpo físico; mantemos nossa consciência a um nível superior e atuamos por meio do corpo físico, o que é muito diferente.

Depois de assim proceder, temos que promover a mesma mudança realizada, com relação ao corpo físico, em nosso corpo astral ou emocional⁷. Novamente encontramos a mesma dificuldade. Geralmente consentimos que nosso corpo emocional pertença ao mundo emocional; permitimos que esse mundo defina nosso corpo emocional, e deixamos que desejos e emoções sejam formados em nosso corpo emocional por influências externas. Por certo, nem sempre somos conscientes disso, pois ainda não fazemos distinção entre o 'eu' e o 'não eu', com referência ao que chamamos mundos 'interiores' - o mundo das emoções e o mundo dos pensamentos - e, em consequência, nos parece que as emoções e pensamentos 'surgem de nosso interior', quando, em realidade, provêm de fora, ou pelo menos os excita o mundo exterior.

Visto pela clarividência, o resultado é que o corpo emocional oferece diversas manchas de cor irregularmente distribuídas, que se alteram facilmente por ação de influências externas. Devemos perceber nosso corpo emocional e considerá-lo como nosso veículo no mundo astral. Temos de submetê-lo firmemente ao domínio do Ego e efetuar nele a mesma mudança que levamos a cabo no corpo físico. Temos de vitalizar o corpo emocional a partir do interior, e enviar através dele as emoções que nos determinamos a ter.

Procuremos experimentar essa mudança em nós mesmos. Tentemos perceber nosso corpo astral livre do todos aqueles desejos mesquinhos e daquelas emoções que são tão perturbadoras, e determinemos quais as emoções que nós próprios - o Ser divino - havemos de consentir nesse corpo. Sintamos essas emoções e as irradiemos consientemente. Inicialmente, sintamos amor; não o amor que deseja possuir, mas o amor que se expande livremente a todos os seres e a todas as coisas. Depois, sintamos devoção - devoção pelo Mestre, pela magna Obra, pelo mais elevado que possamos conceber - e enchamos nosso corpo emocional dessa devoção. Ainda, compadeçamo-nos dos que sofrem; sintamos que nosso coração transborda de piedade por quantos sofrem no vasto mundo. E, finalmente, busquemos aspiração espiritual; sintamos-nos intensamente inspirados pelo superior, e percebamos a verdadeira espiritualidade irradiando de nosso corpo emocional. (...)"

Corpo emocional ou astral é o veículo de nossos bons ou maus sentimentos, como o corpo físico o é de nossas boas ou más ações, e o corpo mental, de nossos bons ou maus pensamentos. Assim como podemos e devemos disciplinar o corpo físico para a prática exclusiva de boas ações e aquisição de bons hábitos e costumes, também podemos e devemos disciplinar nossos corpos emocional e mental para que só alimentem e exteriorizem elevados sentimentos e pensamentos. (N. T.)

(J. J. Van Der Leeuw - Deuses no Exílio - Ed. Teosófica, Brasília, 2013 - p. 25/27)